segunda-feira, 27 de abril de 2009

Crônica da - Mania manipulada pela mídia.

Mulher. Lá pelos 30 ou 35. Cabelo solto, liso, castanho escuro. Um palmo abaixo dos ombros. Roupas discretas e de cores neutras. Ás vezes arriscava uma gabardine vermelha, quem sabe uma echarpe roxa. Maquiagem? Nem pensar. Sobrancelhas por fazer. Unhas sempre muito curtas – para não dar trabalho. Pele nem clara nem escura. Dentes absurdamente brancos. Sapatos pretos, limpos como novos.

Bolsa organizadíssima em ordem de uso durante a rotina diária.

7:00AM - As chaves de casa, que usava para abrir a porta e o portão de entrada de seu prédio, estas eram também as primeiras a voltar para a bolsa.

7:06AM - O moedeiro que carregava sempre separado o dinheiro certo para a passagem de ônibus.

7:07AM - O lenço umedecido para limpar o assento e as mãos.

7:07AM - O livro de suspense ou romance clichê.

7:07AM - Os fones de ouvido conectados a um mp3 quebrado – usado apenas para evitar conversa, até por que ela jamais fora capaz de ler e ouvir música, estudar e ver TV, conversar e cortar batatas.

7:58AM - O crachá da loja de livros onde trabalha como organizadora, contadora e ás vezes faz a faxina por escolha/vontade própria.

8:12AM - O par de óculos para leitura, já antigos, os primeiros que comprou. Comuns, armação de metal, fina, hastes pretas. Nada de especial – como todo o resto aparentemente.

8:12AM - A caneta em conjunto com a lapiseira douradas dentro de um estojo de couro sintético. Objeto de estimação doado por seu Avô que ganhou o presente da irmã na década de 70.

12:10PM - A carteira com os vales alimentação para o almoço vegetariano.

13:00PM - Finalmente o estojo mais importante e indispensável de tudo. Aquilo que era sua motivação de viver. Todos os dias, após qualquer refeição, abria a bolsa com cuidado. Os olhos brilhavam, um sorriso se esboçava em seus lábios um tanto quanto carnudos. As mãos tocavam o estojo azul, plastificado, estampado com delicadas listras brancas. As bochechas coravam levemente de excitação. Sentia o toque. Ficava ansiosa e satisfeita por poder realizar em qualquer local, a qualquer momento, sua higiene bucal! Puxava o zíper, retirava sua mini pasta de dentes Colgate – Ah! Adorava aquele pequenino sabão de boca, cheiroso, macio e refrescante. Tão... Portátil! – pinçava com os dedos a pequena escova de dente azul com glíter – gostava de sentir os dedos encontrando um ao outro, entre eles apenas o tubo e a pasta branca, que desta vez vinha com listras vermelhas. Molhava por 2 segundos a escova já com a quantidade certa de pasta – mais ou menos o tamanho de um amendoim (imaginava sempre alguém que só conhecesse o tal amendoim japonês – talvez no Japão. A boca do indivíduo com espuma de sobra e ardência insuportável – Ria internamente). Levava a escova à boca em câmera lenta. Sentia a pasta tocar seus lábios levemente, a pressão da escova contra os dentes, a gengiva, a formação sutil e quase imediata da espuma. Os dentes da frente por primeiro. A lateral direita. A lateral interna direita... e assim por diante.

Quando a escova de dente completa uma semana de uso, exatamente no seu sétimo dia, as ânsias a invadiam. A boca salivava. O estômago se retorcia. Sentia como se estivesse esfregando um monte de poeira e lixo em seus dentes, cobertos com um pouco de graxa sebosa. A solução era simples. O prazer de ir até o supermercado, sessão de higiene íntima, dentária, escovas novinhas, embalagens invioladas. Cores. Tamanhos. ADULTO. INFANTIL. Macias. Médias. Anatômicas. Em forma de macaco, bob esponja, Barney. Elétricas. Antibacterianas. Limpeza profunda. Clareadoras. Só não gostava das que diziam DURAÇÃO PROLONGADA – Eca!



À noite ela liga a TV e espera nervosa os comerciais dos novos modelos do dia, inventados, desenvolvidos e testados pelos cientistas. Ah, e o melhor, aprovados pelos dentistas! Eles indicam!